Encontro discute pontos de ação judicial - Foto: reprodução

Produtores rebatem entidades e dizem que ação judicial pode causar prejuízo bilionário

A Associação Energia Renováve Potiguar soliticitou ‘direito de resposta’ à matéria publicada no Blog Saulo Vale intitulada “Entidades processam Voltalia por danos ambientais e sociais em Serra do Mel“, datada de 26/05/2025.

O blog reproduz o ‘direito de resposta’, que não necessariamente representa a opinião do editor deste espaço, na íntegra abaixo.

Serra do Mel (RN), 1º de junho de 2025

 

Dirigentes de associações, cooperativas, autoridades locais e agricultores familiares do município de Serra do Mel se reuniram no último domingo na Câmara de Vereadores para discutir os impactos de uma ação civil pública movida pelas entidades FETARN (Federação dos Trabalhadores Rurais do RN), CUT-RN (Central Única dos Trabalhadores) e SAR (Serviço de Assistência Rural e Urbana). A ação judicial, protocolada sem consulta prévia à comunidade local, pleiteia medidas que, segundo os produtores, podem resultar no encerramento de até 80% dos parques eólicos do município.

De acordo com a Associação Energia Renovável Potiguar, os agricultores locais receberam, apenas em 2024, dezenas de milhões de reais em receitas provenientes da produção de energia eólica. Com contratos de arrendamento com vigência média de 50 anos, o encerramento antecipado desses acordos pode representar perda bilionária para os pequenos proprietários ao longo das próximas décadas.

Entidades questionam distância de 2 km de residências

A ação movida pelas entidades pede a suspensão das licenças de parques e o deslocamento de 28 dos 36 parques eólicos do município, alegando que estão instalados a menos de 2.000 metros das residências. Na prática, a medida solicitada leva ao encerramento dos parques, já que não há espaço nas comunidades para abrigá-los a essa distância. A associação que representa os proprietários, no entanto, afirma que esse critério não possui respaldo científico e foi definido de forma arbitrária, ignorando os impactos econômicos e sociais da medida.

Modelo coletivo de produção é referência nacional

Serra do Mel é formada por propriedades familiares de 50 hectares, organizadas em 22 vilas rurais. O modelo local de produção de energia é considerado inovador: em vez de remunerar apenas quem possui torres instaladas em suas terras, todos os proprietários da vila compartilham a receita gerada pelo empreendimento.

“O que temos aqui é um modelo que pode inspirar o Brasil e o mundo”, afirmou José Hélio, agricultor e apicultor. “Essas entidades deveriam vir conhecer nosso modelo, não tentar destruí-lo.”

O agrônomo e proprietário Canindé Maia destacou o baixo impacto ambiental dos projetos: “As torres ocupam menos de 0,5% da propriedade (e na maioria das propriedades não há torres), permitindo a continuidade das atividades agropecuárias”.

Presidente de associação alerta: revisão contratual pode destruir modelo coletivo

Outro ponto de alerta foi levantado por Ricardo Lins, presidente da Associação de Vila Ceará. Segundo ele, foi procurado por representantes das entidades proponentes com a justificativa de que a ação visava melhorar a remuneração dos contratos e garantir mais transparência nos pagamentos. No entanto, ao tomar conhecimento da ação ajuizada, sentiu-se enganado.

“Fiquei espantado quando vi que a ação não trata de nada do que a gente realmente precisa. Falam em revisão contratual, mas isso é muito perigoso, porque pode acabar com o projeto coletivo”, afirmou. Ricardo explica que, em sua vila, a maioria dos proprietários recebe valores modestos porque não possuem torres em seus lotes, enquanto três proprietários concentram os aerogeradores em razão da localização e direção dos ventos. “Se houver uma revisão que mude o modelo de divisão da receita, o dinheiro pode acabar indo só para quem tem as torres”, alertou.

Produtores acusam entidades de manipular dados

Lideranças locais também acusam as entidades proponentes da ação de manipulação de dados públicos, especialmente na área da saúde. Um dos principais pontos da ação é a suposta correlação entre transtornos psicológicos e a presença de parques eólicos.

Contudo, segundo análise de dados do CAPS da Secretaria Municipal de Saúde, os casos de ansiedade e dor de ouvido apresentados como evidência ocorreram no período da pandemia da COVID-19 e majoritariamente em áreas sem torres da empresa operadora dos parques citada na ação. “A alegação de adoecimento causado pelas eólicas é irresponsável e desinformada e é uma forma de engajar a opinião pública contra um projeto solidário e que tem tirado os agricultores da pobreza”, afirmou Antônio Marcos, presidente da Associação Energia Renovável Potiguar.

Mel e castanha: produção em alta, dizem agricultores

As entidades também alegam que a produção de mel e castanha de caju estaria sendo prejudicada pela operação dos parques. Apicultores, no entanto, contestam a versão.

“Meu apiário mais produtivo fica debaixo de uma torre”, disse Carlos, presidente da Associação da Vila Pará. Já Carleno, presidente da Associação dos Apicultores de Serra do Mel-APISMEL, foi categórico: “Nunca produzimos tanto mel como agora”. A entidade que ele preside congrega os apicultores do município e é responsável pela comercialização de cerca de 90% do mel produzido na cidade.

Quanto à cajucultura, Euzébio Maia, ex-vereador e produtor local, rebateu: “Dizer que as eólicas afetam o caju é piada. O que houve foi poeira durante a implantação das torres e foi devidamente indenizada, as torres não geram poeira”.

Fundo milionário gera revolta

O ponto mais polêmico da ação é o pedido de criação de um fundo de R$ 106.425.000,00, que seria gerido pelas próprias entidades (FETARN, CUT e SAR). Agricultores relataram surpresa ao verem seus nomes vinculados à ação sem consentimento.

“Essas entidades querem tirar nossos direitos e ainda lucrar com isso?”, questiona Dona Lucilene, moradora da Vila Amazonas. “Nunca ouvi falar nelas.”

Seu Severino Viana expressou preocupação: “Não durmo direito. Isso pode acabar com tudo que construímos aqui.”

“Não quero dinheiro baseado em mentiras”, afirma fundador da CUT e colono da Serra do Mel

O agrônomo, advogado, poeta e escritor Crispiniano Neto, colono da Vila Amazonas, também se manifestou. Ele lembra com orgulho que foi fundador da CUT no congresso de São Bernardo, em 1983, além de parceiro histórico da FETARN e SAR. No entanto, lamenta profundamente que essas entidades desconsiderem o longo histórico de organização comunitária de Serra do Mel, ignorando associações, cooperativas e movimentos sociais locais ao proporem uma ação sem diálogo com as comunidades e com base em alegações falsas.

“Dizer que as pessoas estão adoecendo ou que está havendo queda de produção por causa das eólicas é um absurdo. Nunca se produziu tanto mel, castanha e caju na Serra do Mel”, afirmou. Ele também criticou o uso de seu nome na ação sem consentimento: “Eu preciso de R$ 100,00, mas não quero R$ 100.000,00 baseado em mentiras. Quero o direito de decidir sobre minha propriedade e minha vida. É isso que essas entidades estão me tirando.”

“Querem lacrar e lucrar”: dirigente aponta uso indevido de insatisfações pontuais

Segundo Erinaldo Lourenço, presidente da Associação de Vila Acre e dirigente da Associação Energia Renovável Potiguar, algumas comunidades demonstraram insatisfação por terem recebido menos torres do que o inicialmente esperado, o que reduz a receita rateada entre os proprietários — já que o pagamento é feito com base na produção total de energia. Também há reivindicações por maior transparência nos dados de geração e faturamento dos parques.

Erinaldo, porém, faz um alerta: “Essas insatisfações foram capturadas por essas entidades e usadas como pano de fundo para uma ação que só interessa a elas. Querem lacrar e lucrar. Lacrar com um gesto de ativismo ambientalista e lucrar com a criação de um fundo milionário em benefício delas próprias.”

Audiência pública da Assembleia é adiada após Câmara recusar espaço

Mais um revés para os propositores da Ação Civil Pública ocorreu nesta semana. Uma audiência pública da Assembleia Legislativa do RN, marcada para a esta sexta-feira, 6 de junho de 2025, e que aconteceria na Câmara Municipal de Serra do Mel, foi adiada.

O motivo: a Câmara cancelou o empréstimo do espaço, sinalizando, nos bastidores, desconforto com o conteúdo da ação. Vereadores argumentaram que não querem contribuir com uma iniciativa que pode causar grande prejuízo social e econômico ao município.

Processo foi redistribuído para comarca competente

Inicialmente protocolada na comarca de Natal, a ação foi considerada fora da competência territorial e redistribuída para a Comarca de Mossoró, responsável por Serra do Mel.

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Saulo Vale

É formado em Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo, pela UERN. Apresentador do Jornal da Tarde, Rádio Rural de Mossoró, e do Enfoque Político, Super TV. É também correspondente de política das rádios da capital e do interior, como 97 FM de Natal, 91 FM de Natal e Rádio Cabugi do Seridó.

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